ITALIA INNOVATIVA – Itália no espaço e as contribuições para a ciência e tecnologia

É um prazer iniciar esta nova coluna L’Italia Innovativa (“Itália Inovativa”) na Pittoresca, em conjunção com as comemorações do Dia da República Italiana, e dou as boas-vindas a todos os leitores.

Uma das coisas bonitas do meu trabalho é que… você sempre muda de função. No decorrer da profissão, é comum que a cada três ou quatro anos, os diplomatas, além de se deslocarem de país (com paradas também na Itália), acabam se ocupando dos mais variados temas: política, economia, comércio, segurança , promoção da cultura e língua italiana, ciências e tecnologia… Durante minha última missão “romana” no Ministério das Relações Exteriores e Cooperação Internacional, lidei com a cooperação científica, tecnológica e espacial. Daí a ideia de contribuir com Pittoresca com algumas narrativas sobre a Itália Inovativa.

O nosso Belpaese é universalmente conhecido por suas contribuições à cultura clássica e às belas artes. Todo mundo conhece, ou conhece a fama de Florença, Veneza, Roma. Cada um de nós já ouviu as árias de Vivaldi ou Puccini. Todo mundo já leu alguns versos de Dante Alighieri. Mas enquanto a Itália é unanimemente considerada uma potência mundial em termos de arte e literatura, pouca gente conhece “a bota” como o berço da ciência e da inovação. Esta coluna visa, portanto, oferecer “pílulas” sobre as enormes contribuições italianas para o desenvolvimento científico e tecnológico.

Hoje vamos começar pelo espaço.

A curiosidade pelos astros sempre foi forte no ser humano, assim como o cosmos sempre foi objeto de estudos dos mais importantes pensadores de todas as épocas. O próprio Dante, na Divina Comédia, concentra todo o conhecimento de seu tempo no campo da astronomia e da cosmologia. Não é por acaso que cada um dos três cânticos termina com a palavra “estrelas” (Inferno: “e por isso saímos para ver novamente as estrelas”; Purgatório: “puro e disposto a subir às estrelas”; Paraíso: “o amor que move o sol e as outras estrelas”). Mas aquele que mais revolucionou o mundo da astronomia foi, sem dúvida, Galileu Galilei. Físico, astrônomo, filósofo e matemático, Galileu é considerado o pai da ciência moderna. Aperfeiçoou o telescópio e fez descobertas revolucionárias que mudaram para sempre a física astronômica ao propor o sistema heliocêntrico, mas, como sabemos, pagou um preço alto, pois entrou em contradição com o poder eclesiástico, ainda fortemente ligado à antiga concepção geocêntrica (nota: Galileu foi condenado por suas atividades pela Inquisição em 1633, mas a Igreja reconheceu oficialmente o erro somente em 1992…).

Galileu não era apenas um astrofísico. Teve uma contribuição fundamental nos estudos científicos em sentido amplo, ao introduzir o método experimental na pesquisa científica. Muitas evoluções científicas dos últimos séculos são baseadas em estudos de Galileu, mas antes de tudo, ele é o precursor de muitos matemáticos, físicos, astrônomos e engenheiros que contribuíram para fazer da Itália uma potência espacial.

A Itália é uma potência espacial? É claro que é! Já na década de 1930 foi fundada em Guidonia (ao sul de Roma), a “Cidade do Ar”, que logo se tornou um ponto de referência para a pesquisa aeronáutica internacional. Em Guidonia, desenvolveu-se uma estrutura imponente com laboratórios extremamente sofisticados e sistemas de simulação de voo que, na época, nem existiam nos Estados Unidos. Após a Segunda Guerra Mundial, a nova atenção do governo republicano logo levou a dois importantes resultados tangíveis. A primeira, com o lançamento do San Marco 1 em 15 de dezembro de 1964, graças ao qual a Itália se tornou, depois dos EUA e da URSS, o terceiro país da história a colocar um satélite em órbita com total autonomia. A segunda, em 1966, com a fundação do Centro Espacial Luigi Broglio, uma importante base de lançamento e monitoramento de atividades espaciais construída em Malindi, no Quênia (nota: as bases de lançamento são frequentemente construídas em locais equatoriais porque nessas latitudes, a órbita dos vetores requer menos energia graças ao aproveitamento do efeito centrífugo em relação à maior velocidade de rotação terrestre).

Em 1988, nasce, por sua vez, a ASI, Agência Espacial Italiana, ponto de referência do espaço italiano. Nos anos seguintes, finalmente os italianos estavam prontos para ir ao espaço: durante uma seleção muito difícil, escolheu-se o biofísico Franco Malerba como o primeiro astronauta, seguido por Umberto Guidoni, Maurizio Cheli, Roberto Vittori, Paolo Nespoli, Luca Parmitano e, em 2014, finalmente, a primeira mulher, Samantha Cristoforetti (que em sua última missão, comandou a Estação Espacial Internacional).

A Itália é hoje um key player na arena internacional. Somos um dos poucos países do mundo a ter um setor espacial e aeroespacial caracterizado por uma cadeia de fornecimento completa de tecnologias, produtos e serviços: no sentido de que somos capazes de produzir e gerenciar tudo o que é necessário para ir ao espaço. Cerca de 250 empresas operam no setor, entre grandes e PME especializadas, gerando um volume de negócios anual que chega a 2 bilhões de euros. Mais de 50% da Estação Espacial Internacional é fabricada na Itália e tem tecnologia italiana.

Uma visão geral da indústria espacial italiana está contida neste vídeo que fizemos com a ASI.

A Itália é um parceiro de referência dos principais players internacionais no campo espacial e aeroespacial, como a NASA (Agência Espacial dos Estados Unidos) e a ESA (Agência Espacial Europeia), e está entre os poucos países signatários do programa Artemis (iniciativa inspirada no governo dos Estados Unidos que levará, de novo, o ser humano à lua, com a perspectiva de construir bases estáveis em solo lunar e, posteriormente, realizar a exploração humana em Marte).

Na observação da Terra, através de investimentos realizados pela ASI no sistema Cosmo Sky-Med (programa do qual também participam algumas agências latino-americanas), a Itália está na vanguarda da previsão e prevenção – por exemplo – de desastres ambientais, ao garantir rápidas intervenções em áreas de crise, medir os efeitos das mudanças climáticas e assim por diante.

Voltando a Galileu, sempre fomos muito ativos no campo da observação do espaço e nos candidatamos para hospedar o Telescópio Einstein na Sardenha, um megatelescópio – ou melhor, um detector de ondas gravitacionais de terceira geração – que está entre as maiores infraestruturas estratégicas de pesquisas europeias.

A política espacial italiana e sua excelência conferem ao nosso país, portanto, uma significativa autonomia estratégica e forte competitividade no mercado internacional. É conhecido que a space economy representa um componente cada vez mais importante, diria mesmo vital, do nosso cotidiano. Por isso, para o próximo triênio, a Itália destinou um montante de 7,5 bilhões de euros ao setor espacial, entre atividades “nacionais” da ASI e contribuições para as diversas formas de cooperação internacional, em particular, para as atividades da ESA e o programa Artemis.

7,5 bilhões de euros? Você pode se perguntar por que investir tanto dinheiro no espaço quando ainda temos tantos problemas “terrestres” para resolver em nosso dia a dia? Agora pense em seu dia a dia. Você sabia que muitas atividades cotidianas, de produtos utilizados com frequência e de serviços que salvam vidas são produzidos no espaço ou dependem de tecnologias espaciais? O GPS com o qual nos guiamos no carro. Previsões meteorológicas e todo o sistema de prevenção de desastres naturais. Os sistemas de telecomunicações com os quais falamos em videochamadas com nossos parentes e amigos do outro lado do planeta. Sistemas de satélite para a segurança de nossas cidades. Muitos medicamentos estudados no espaço através da ausência de gravidade. Os membros biônicos com os quais restauramos a mobilidade de pessoas amputadas que foram feitos por robôs usados no espaço.

Os modernos sistemas de purificação de água foram desenvolvidos pelos engenheiros do programa Apolo (sim, o mesmo que levou Armstrong e Aldrin à lua em 1969) para fornecer água potável aos astronautas com segurança e eficiência, eliminando bactérias e outros micro-organismos potencialmente nocivos da água transportada em naves.

Esses e mil outros motivos impulsionam o ser humano para aventuras no espaço e são de fundamental importância, apesar dos muitos problemas não resolvidos aqui na Terra. Mas gosto de pensar que ir ao espaço é mais um sonho do que uma necessidade, aquele sonho de aventura que sempre levou homens e mulheres a cometerem loucuras, a ir onde ninguém ousara antes, a mover a barra do conhecimento para um pouco além.

Me despeço com mais um vídeo feito com a ASI, que, talvez, resuma melhor minhas palavras sobre este sonho que nos inspira a ir para o espaço.

Domenico Fornara é Cônsul Geral da Itália em São Paulo.

Escreve mensalmente sobre tecnologia e inovação em Italia Innovativa.

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