ITALIA INNOVATIVA – Mas quão modernas são essas raízes?

Dissemos no primeiro artigo de nossa coluna que a Itália é conhecida por suas excelências históricas. Arte, cultura… mas também gastronomia! Orgulhamo-nos de ter inventado o gelato (há mais de 2000 anos), de pratos com centenas de anos, dos sabores típicos de nossa terra… dos muitos pratos elaborados segundo “receitas da avó”. A culinária é, sem dúvidas, uma das raízes mais importantes da cultura italiana.

No entanto, a Itália é também o país que mais do que outros aplica a inovação para melhor valorizar a nossa cozinha tradicional (ou melhor, as nossas cozinhas tradicionais, visto que cada região, cada cidade tem as suas especialidades enogastronômicas).

“Food 4.0” é a nova palavra de ordem, ou seja, a mais recente transformação profunda da indústria agroalimentar italiana impulsionada pela inovação científica e tecnológica que visa tornar os produtos e processos de produção cada vez mais sustentáveis, seguros, rastreáveis ​​e de alta qualidade.
Por outro lado, o agroalimentar é o primeiro setor da economia real italiana, com mais de 1,3 milhão de empregados, um valor de produção superior a 200 bilhões de euros e um volume de exportações superior a 60 bilhões de euros (e em constante crescimento). A Itália é também o primeiro país da União Europeia na produção de frutas e vegetais, vinhos e azeites e é o segundo no mundo com a melhor balança comercial no setor de laticínios.

Com estes números, e num mundo repleto de questões e desafios críticos (aumento da procura global de bens alimentares, alterações climáticas, custos da mão-de-obra), é evidente que quem gera as cadeias de produção e distribuição deva necessariamente encarar a pesquisa como um parceiro fundamental. Na Itália, nos últimos anos, os investimentos em inovação por parte de todos os players do setor agroalimentar aumentaram exponencialmente: agricultores e produtores, distribuidores, fabricantes de máquinas agrícolas para embalagem e conservação de produtos alimentares, cadeia de frios, etc. Hoje, 8% do faturamento da indústria enogastronômica italiana é reinvestido todos os anos em pesquisa e desenvolvimento. Você entendeu bem: “faturamento”. Esta é uma quantia absolutamente considerável.

O que podemos melhorar com esses investimentos?

Podemos tornar a produção agrícola mais eficiente, economizando energia, água e recursos. Podemos melhorar o controle de qualidade. Podemos, e devemos, na verdade, reduzir o desperdício alimentar, também através de uma melhor sincronização entre oferta e procura. Podemos deixar mais eficientes a distribuição intermediária e capilar ao cliente. Podemos valorizar o território buscando criar o máximo de ofertas a quilômetro zero, principalmente para produtos frescos.

Darei alguns exemplos.

Em maio, visitei o Agrishow de Ribeirão Preto 2023, a mais importante feira do setor alimentício da América Latina que acontece todos os anos entre o final de abril e o início de maio. No pavilhão italiano, esplendidamente organizado pelo ICE-Italian Trade Agency, percebi, mais uma vez, a superioridade da tecnologia italiana no setor de máquinas para a agricultura e para a produção, embalagem e conservação de alimentos. Os estandes das empresas italianas estiveram entre os mais visitados justamente porque poucos sabem fazer o que a Itália faz neste setor. Fiquei profundamente impressionado com o altíssimo nível tecnológico de muitas das máquinas expostas. Para dar um exemplo, uma famosa empresa italiana de torrefação de café patenteou uma máquina que, ao controlar a qualidade de milhões de grãos de café, consegue descartar o único grão cujas características não correspondem aos padrões desejados. É assim também que se obtém o famoso aroma do expresso italiano.

Também aplicamos alta tecnologia no setor agrícola. Fiquei muito impressionado com um projeto que a Universidade de Trento está realizando em conjunto com colegas da Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, cofinanciado pelo Ministério das Relações Exteriores italiano no âmbito do Protocolo Executivo de Cooperação Científica e Tecnológica 2022-2024. O projeto (Deep learning for precision farming mapping) baseia-se no uso generalizado de sensores controlados remotamente e drones para obter mapeamento de culturas de alta precisão. Em suma, é um controle de qualidade realizado de forma automatizada que não só custa muito menos do que o operacional humano, mas que possui características muito superiores de pontualidade, capilaridade e precisão.

A inovação também nos ajuda na cozinha de casa e nas compras. As tecnologias acessíveis estão se difundindo para cozinhar de forma mais organizada e saudável. Um exemplo disso é o cozimento em baixa temperatura, que consiste em cozinhar os alimentos a uma temperatura constante entre 50° e 65° C, permitindo que os alimentos cozinhem através da recirculação do calor sem dispersar aromas e nutrientes. Outro exemplo é o crescimento do e-commerce, que se consolida cada vez mais no setor alimentar. A Internet das Coisas também não poupa o setor alimentar e não estamos longe de ter geladeiras ligadas à rede que enviarão automaticamente o pedido de compra quando a quantidade de determinados produtos essenciais na nossa geladeira estiver abaixo de um nível por nós estabelecido.

A estas alturas, vocês devem se perguntar: mas será que toda essa tecnologia ofuscará a experiência do agricultor italiano, a criatividade dos nossos chefs, a habilidade de quem cria os nossos produtos típicos e de denominação protegida? Bastará ter os mais modernos equipamentos e qualquer um poderá produzir o Brunello di Montalcino, a mozzarella di bufala di Battipaglia ou o presunto cru de Parma?

Não. Sou um grande entusiasta (e apoiador) da inovação científica e tecnológica, mas continuo a ser (também) um profundo humanista. Sempre coloco o ser humano em primeiro lugar. A tecnologia nada mais é do que uma ferramenta que podemos utilizar (para o bem ou para o mal) para melhorar processos, produtos e serviços. E é preciso saber utiliza-la: o que não é fácil. Não podemos nos distanciar das nossas raízes, nem podemos assumir as raízes de outras culturas. A inovação pode nos ajudar a melhorar o que já está inerente em nosso DNA cultural, para valorizar ainda mais as nossas raízes. Em particular, no setor enogastronômico, a qualidade permanecerá sempre ligada e influenciada pelo território, pela tradição, pela cultura e pelo gosto de quem inventou e desenvolveu aquela cozinha ao longo de centenas de anos.

A prova disso? Faça turismo enogastronômico na Itália; tudo ficará mais claro para vocês.

Mas se Maomé não vai à montanha, a montanha vai até Maomé. Se nos próximos dias vocês não puderem ir à Itália, a Itália virá a São Paulo. O Consulado Geral organizará a 12ª edição da Settimana della Cucina Regionale Italiana em São Paulo, de 23 a 29 de outubro. Convidamos 20 chefs, um de cada região italiana, que estarão presentes em 20 dos melhores restaurantes italianos de São Paulo e oferecerão receitas e produtos típicos de seus territórios de origem para almoço e jantar. Preparem seus garfos e facas e escolham qual cozinha regional italiana vocês desejam conhecer através do site da iniciativa.

Me despeço, como sempre, com um vídeo sobre a inovação italiana:

Domenico Fornara é Cônsul Geral da Itália em São Paulo.

Escreve mensalmente sobre tecnologia e inovação em Italia Innovativa.

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